20.10.08

Cabo Verde: Formação sobre elaboração de planos de acção e seguimento de projectos – o que aprenderam os formandos?

Dois dos quadros do Ministério do Ambiente, do Desenvolvimento Rural e Recursos Marinhos de Cabo Verde explicaram ao Blog CPLP-FAO o que aprenderam nos primeiros dias da formação para elaboração de planos de acção e seguimento de projectos, que decorreu entre 22 de Setembro e 3 de Outubro, na cidade da Praia, Cabo Verde.


Depois desta capacitação, os representantes do Ministério em cada uma das ilhas começam agora a trabalhar na formulação de Planos de Desenvolvimento Agrícola Regionais, que vão ajudar a traçar prioridades em matéria das pescas, pecuária, florestas e recursos hídricos.

Para Francisca Fortes, delegada do MARMDR, e agrónoma, a formação, que se realizou na Achada São Filipe, foi uma mais-valia para a preparação dos planos de acções e para as estratégias de desenvolvimento na ilha.


“Os delegados são uma espécie de gestores, gerem tudo o que diz respeito à delegação, e quando há a possibilidade de participar numa formação na área da gestão eu me interesso em participar”, explica Francisca Fortes. A agrónoma sente agora mais preparada para “determinar os problemas, os planos de acção, os actores e também a interacção entre os actores”.

António Andrade, da delegação do Ministério em Santo Antão, defende, por seu lado, que esta iniciativa é um “reposicionamento” da abordagem que tem vindo a ser aplicada pelo Ministério no combate à pobreza e no desenvolvimento das ilhas.


“Nós que estamos nas ilhas sentimos que o desenvolvimento tem sido essencialmente encarado numa óptica sectorial. Como estamos no terreno sentimos que é preciso uma abordagem territorial. Às vezes, há actividades em que devia estar presente a Câmara Municipal e os serviços desconcentrados e há uma separação, por razões diversas, tornando as actuações parcelares e desintegradas.

Depois, os efeitos geralmente não se fazem sentir e os impactos, embora não sendo negativos, também não alcançam os objectivos pretendidos. Por isso, é bom este reposicionamento da abordagem, em que se tem uma perspectiva regional, ou territorial”, explica o técnico do Ministério em Santo Antão.

Na sua ilha, defende, já “têm sido feitos muitos investimentos mas Santo Antão ainda é vista estatisticamente como a ilha mais pobre”: “O problema é da abordagem, mas mudando isso, julgo que os impactos serão positivos”.


Na sua opinião, os delegados do Ministério devem ter uma mais activa, “mesmo que haja determinados condicionamentos a nível central”. Quem está no local é deve “ter sentimento empreendedor e um sentido positivo de desenvolvimento da ilha e para as populações, procurando encontrar pontos de encontro e romper com os bloqueios”, explica António Andrade.

“O papel do delegado é encontrar pontos de encontro entre os diferentes actores e encontrar abordagens comuns. É preciso dialogar, negociar e brigar, mas sempre em função do melhor”, reitera o representante da ilha das montanhas.

Na formação, destacou a mensagem passada pelo expert da FAO Paolo Groppo: “Disse-nos que é fundamental contestar, objectar, apresentar novas ideias e encorajou-nos a aceitar diferentes pontos de vista como uma situação normal. Num espaço, temos vários interesses, e o mundo é feito disso, mesmo na família, como ele exemplificou, o pai tem que negociar com a mãe, com os filhos, para que a família possa ser uma família real. O mesmo acontece a nível de um país, de uma comunidade, de um território: é preciso negociar, em função do que é o objectivo comum. É esta filosofia que já apreendi, de que temos que construir socialmente um território comum, na base das nossas brigas, na base dos nossos encontros e desencontros”.


Sobre a equidade de género – questão que levantou alguma discussão num dos primeiros dias da formação – António Andrade acredita que “a mulher ficou, historicamente, debilitada por diferentes constrangimentos que a sociedade lhe foi impondo e o homem foi ganhando vantagem com isso”. Dá o exemplo de muitas mulheres cabo-verdianas que não puderam continuar os estudos, porque só lhes era permitido fazer a quarta classe (primeiro ciclo do ensino básico), o que contribuiu para que “hoje existam mais técnicos-homens e ministros-homens”.

O representante do MARMDR considera que se precisa reposicionar esta situação e colocar as mulheres no mesmo nível, mas diz não concordar que “a mulher deixe de ser mulher e passe a ser mais um homem”. “A mulher é feminina, e o homem e a mulher encontram-se numa base de amor. Tem que haver uma afectividade que é construída na base de pequenas coisas. E no lar, nessas pequenas coisas a mulher deve assumir o papel de mulher e o homem o papel de homem, numa complementaridade.

Francisca Fortes também defende que legalmente “a mulher e o homem têm os mesmos direitos, mas que na prática isso não se verifica”. “Acho que isso advém da nossa história”, justifica.


No entanto, salienta que, em termos profissionais, as mulheres em Cabo Verde já demonstraram que têm capacidade e estão a ocupar postos importantes no país. Acredita também que em algum tempo a sociedade vai mudar na prática a forma como encara a questão do género porque “existem já muitas famílias a educar o rapaz e a menina da mesma forma”.